quinta-feira, abril 28, 2011

Escrever contos, por Miguel Sanches Neto

Escrever contos
muito pouco te a ver
com contar casos
que ouvimos na rua,
soubemos por amigos,
jornais ou pela tevê.
Um conto é um corte
na pele fina do hoje
e ele sangra tanto
que, para estancá-lo,
resta-nos o manto
de termos cotidianos.

Não escreva contos
para fazer graça.
Só admita a piada
quando for amarga.
A tristeza do tempo
que nunca pára,
mesmo o amor maior
nos espeta o peito
com sua pior farpa.
Conto repele risadas.
Isso é para a crônica
que ajuda a digerir
as comidas pesadas.

Apenas escreva contos
em estados de fúria,
com um ódio santo
contra toda a turba.
Um conto necessário
é um ato de cura,
uma catarse em meio
à insanidade de tudo.
Escreva contos para
emudecer esse mundo
tomado pela usura.

Não escreva contos
como quem brinca
com palavras móveis,
incrustáveis nas frases.
Conto já nasce pronto.
Todo esforço vem antes,
ao se sofrer o corte
e sangrar até a morte.
Não é com palavras
que se faz um conto,
mas com sentimentos
imensos de desencontro,
entre o eu e o mundo,
mesmo quando o mundo
é quem nós somos.

Tente escrever um conto
que te prepare um pouco
para te ver como morto.
Estar vivo é algo falso
porque breve em demasia.
Todo conto é um canto,
um canto de despedida.

Não escreva contos
com palavras eruditas.
Conto é linguagem viva,
a mesma usada no bar,
na hora do namoro,
no balcão da padaria.
Palavras do dia-a-dia,
que súbito se concentram
para dizer de uma vez algo
que ninguém mais diria.

Escreva os seus contos
como quem se suicida,
sem deixar bilhetes
dando os tais motivos.
Um conto não se explica.
É morte imprevisível,
a vida como enigma,
a força de um mistério
que não se silencia.

Só escreva os seus contos
quando não houver quando.

Fonte: http://herdandoumabiblioteca.blogspot.com/2010/09/escrever-contos.html

quarta-feira, abril 27, 2011

Quais as diferenças entre Artigo, Conto, Crônica e Ensaio?

É comum, até para leitores mais experientes, haver uma confusão sobre a classificação de um texto como artigo, conto, crônica ou ensaio. Eu mesmo, apesar de já ter lido muito à respeito, volto à essa questão frequentemente. Na tentativa de jogar um pouco mais de luz sobre o tema, segue abaixo um texto muito simples e eficiente publicado no site Recanto das Letras, de autoria de Obed de Faria Jr. Atente-se também à diferenciação feita pelo autor entre conto, novela e romance.

Existem espalhadas por aí diversas explicações teóricas – umas mais, outras menos – buscando diferenciar artigo, conto, crônica e ensaio. Por certo, não serei eu a refutar, de maneira categórica, tão abalizadas descrições e opiniões que existem a respeito disso.

O importante, creio eu, é notar que existem circunstâncias onde essas modalidades – ou sub-gêneros – de prosa, confundem-se entre si, até porque determinados hibridismos, vez por outra, são inevitáveis.

Não possuo nenhuma qualificação formal que me habilite a emitir conceitos de forma irrefutável, contudo, brinco de escrever faz umas três décadas e um tanto. E, obviamente, gosto de escrever porque adoro ler. Em função, tanto de uma coisa como de outra, acabei me aventurando a tentar entender um pouco sobre as técnicas da instigante arte da escrita. Se nada do que eu disser pode ser considerado como algo definitivo, talvez possa servir de referência a quem também se interesse e queira estudar um pouco mais.

Para que tudo não fique muuuuuuuuuuuuuuito teórico – porque isso é por demais chato, às vezes – tentarei falar sobre os assuntos da forma mais simples que me for possível.

CONCEITOS PRELIMINARES

Texto Dissertativo X Texto Narrativo

Dissertar é falar sobre algum tema de maneira explicativa. É dizer o quê, por que, onde, como, quando, em função de que e ou a fim de que. Não são necessários todos esses elementos, mas uma descrição para ser inteligível necessita, indispensavelmente, de algum tipo de articulação lógica que, enfim, explique algo ou especifique a seu respeito.

Narrar é expor uma trama, um enredo. Dizer sobre alguém passando por algo na vida – ou fora dela, hehehe - sozinho ou com mais alguém, pensando com seus botões ou interagindo com outros. Só que pressupõe a existência de uma história a ser contada.

Texto Ficcional X Texto Não Ficcional

Ficcional é aquilo que é fruto da imaginação, da inventividade. Não ficcional é aquilo que procura ser o mais fiel à realidade, quanto possível. Esses são dois extremos num espectro que admite vários matizes. Ou seja, raramente um texto é totalmente ficcional e, ainda, da mesma forma, raramente consegue ser totalmente fiel à realidade.

Quase tudo que se inventa é baseado em algo que já existe, existiu ou poderia existir – por mais fantasioso que possa ser. Mesmo um relato extremamente fantástico possui algum paralelo com a realidade, caso contrário, não haveria termo de comparação para que sua natureza fantástica se sobressaísse.

Por outro lado, por mais que se tente falar da realidade com total isenção, é inevitável que a percepção individual de quem esteja a relatar alguma coisa acabe imprimindo alguma subjetividade de natureza totalmente particular.

Por fim, existem aquelas criações que são, propositalmente, uma parte ficcional e outra parte nem tanto. O que prepondera mais ou menos é irrelevante, pois depende da intenção de quem criou.

Dito isso, passemos à análise das modalidades ou sub-gêneros de prosa, propriamente ditos.

CLASSIFICAÇÃO DE TEXTOS EM PROSA

Não pretendo aqui enfrentar a árdua tarefa de analisar as classificações literárias dos textos. Isso demandaria um compêndio – que eu não tenho a menor condição de esboçar – e, ainda, enveredaria por conceitos teóricos que vêm de tempos imemoriais.

Basicamente, o enfoque que parece interessante, neste ensejo, é simplesmente dizer que os gêneros literários – DENTRE OUTRAS CLASSIFICAÇÕES – “podem” ser divididos em prosa ou poesia. Mesmo entre esses dois gêneros, há momentos em que ambos se confundem, existindo a chamada prosa poética ou poesia feita de concatenações em prosa.

Para simplificar, prefiro pensar que um texto é tanto mais “prosa” quanto menos seja “poesia”; e vice e versa. Poesia é manifestação cheia de emoção, lirismo ou, mesmo, mero exercício lúdico com as palavras. As figuras que atribuem a um texto a condição de ser poético ou não são tão variadas e dependem tanto do gosto ou da opinião de quem lê, que só isso já seria motivo para se falar e falar pela eternidade e mais dois dias.

De qualquer maneira, o que vem a ser poesia, se não estiver explícito na conformação do próprio texto composto em versos, ou pelas figuras que utilize, é algo bastante intuitivo para a maioria das pessoas.

Portanto, prosa é o que não é poesia – mas nada impede que aquela tenha um pouquinho desta; até porque esta é sempre uma variante daquela. (Agora, eu viajei!!! kkk)

Sem pretender esgotar as inúmeras hipóteses possíveis, vamos diretamente ao cerne do que se pretende por aqui.

Artigo

Artigo é um texto dissertativo e de cunho não ficcional. É um relato sobre fatos, pessoas ou circunstâncias existentes na realidade concreta e sobre os quais se pretenda descrever aspectos tidos por relevantes ou, ainda, fundamentar alguma opinião.

Representa uma articulação que toma realidades próximas ou remotas, no tempo e ou no espaço, como base que dá ensejo e teor ao texto. O articulista não precisa necessariamente ter contato direto com os fatos e circunstâncias sobre os quais se proponha a falar, podendo valer-se – e quase sempre o faz – de informações e notícias que lhe cheguem ao conhecimento por relatos de outrem e ainda com base em pesquisas direcionadas especificamente para tal fim.

Crônica

Crônica é um texto narrativo e pode ser, em maior ou menor grau, de cunho ficcional. Versa sobre experiências, vivências ou pontos de vista pessoais do cronista. Pode tratar de relatos sobre fatos ocorridos em tempos distantes ou em momentos atuais e – por que não? – até divagações sobre o que esteja por acontecer. De qualquer forma, basicamente, são impressões essencialmente pessoais de quem escreve.

Ensaio

Ensaio é um texto dissertativo e essencialmente não ficcional. Não é um artigo, porque, por mais que parta de informações mais ou menos remotas com relação ao ensaista, busca fundamentar uma visão pessoal que ele tenha sobre algum tema. É uma divagação sobre algum tema não necessariamente pessoal, porém, imprimindo premissas, inferências e conclusões opinativas de quem o escreve. Tende a lidar com assuntos e interesses que remetam a um enfoque universalista – ou que assim se pretenda sejam encarados. É alguém expondo sua opinião pessoal sobre uma verdade que, a seu modo de ver, precisa ser apresentada a todos.

Conto

Conto é um texto narrativo e essencialmente ficcional. É uma trama que gira em torno de algum acontecimento ou circunstância, no mais das vezes não real, envolvendo um ou mais personagens.

Gosto de dizer que um conto é uma historinha. Fica tão mais fácil de entender. As piadas são bons exemplos de contos que se transmitem por tradição oral. Ou seja, todo mundo já ouviu ou já contou um conto.

O que diferencia um conto de uma novela ou um romance é a limitação em algum ou alguns de seus elementos. Ele pode ser curto ou longo, porém tende a não ser demasiadamente longo em função da própria limitação de seus demais aspectos. Ele costuma girar em torno de uma única trama, enquanto que os outros gêneros criam tramas paralelas que transcorrem em conjunto com a trama principal. Tende a ter poucos personagens – às vezes, um só – enquanto que os outros gêneros costumam ter um “elenco” bem maior, até para que as diversas tramas tenham lá seu próprio desenvolvimento.

HIBRIDISMO ENTRE AS MODALIDADES

Há textos que podem ser classificados tanto como artigos, quanto como crônicas. A descrição de fatos e circunstâncias que venha acompanhada de uma grande carga opinativa do articulista, acaba ganhando contornos que tendam a aproximar-se da crônica, na medida que as impressões pessoais tenham uma preponderância relevante.

Da mesma forma, há crônicas que se aproximam de artigos. Isso porque utilizam tanto de informações e fatos remotos ao cronista que, mesmo sendo seu intuito expor suas impressões essencialmente pessoais, a grande carga de elementos externos ou remotos à sua realidade acaba lhe conferindo contornos de um artigo.

Por outro lado, há crônicas que tangenciam assuntos tão universais e cujo trato pelo cronista seja tão profundo, que acabam se confundindo com um ensaio. Há textos, inclusive, em que fica difícil distinguir o que realmente sejam, nesse aspecto.

Também, há crônicas que são narrativas construídas de tal forma que acabam se configurando quase como contos. Talvez – penso eu, particularmente – nesses casos, tanto quanto mais ficcional seja a narrativa, tão mais seja um conto; e vice e versa. Porém, são fartos os exemplos onde contos do cotidiano e crônicas simplesmente se equivalem.

Portanto, há áreas "cinzentas" onde os hibridismos entre as modalidades ou sub-gêneros de prosa se confundem de tal forma que não é possível distingui-los como sendo esse ou aquele tipo.

EXEMPLOS CONCRETOS

Há alguns anos o Brasil passou por uma crise no fornecimento de energia elétrica que ficou conhecida como “apagão”. Aliás, estamos prestes a passar por outro logo, logo (apesar dos desmentidos governamentais).

A partir do tema “apagão”, a construção de textos poderia ser assim desenvolvida

Artigo sobre o “apagão”

Relataria sobre as fontes de energia elétrica no Brasil, suas dimensões e capacidades, distribuição nas diversas regiões, as soluções adotadas anos atrás, as circunstâncias atuais, as opiniões do governo, de especialistas na área, das empresas fornecedoras, dos consumidores e, também, uma conclusão do próprio articulista sobre os rumos desse problema num futuro próximo.

Crônica sobre o “apagão”

Narrativa sobre as agruras e percalços do cronista quando do racionamento de energia elétrica, apontando fatos e circunstâncias curiosos, engraçados ou comoventes que, a partir de uma circunstância particular possa provocar a identificação dos leitores.

Ensaio sobre o “apagão”

Dissertação relatando sobre a crise energética do planeta, em busca de soluções de fontes renováveis, abordando depredação do meio ambiente, desafios tecnológicos, a dependência inexorável da humanidade da energia elétrica e concluiria sobre os confrontos entre os limites éticos da exploração de recursos na busca de manter as conquistas de conforto do homem no século XXI e pelas gerações vindouras.

Conto sobre o “apagão”

A história de recém casados, totalmente apaixonados que, ao irem morar numa casa alugada, descobriram que as limitações impostas pelo racionamento iriam lhes obrigar a adaptarem suas rotinas. As pequenas disputas em torno das decisões sobre o que e como a energia elétrica seria usada vai deteriorando o relacionamento colocando-os em pé de guerra. O final... bem, daí já é outra história, né?

CONCLUSÃO

Nada disso esgota o assunto e, certamente, o intuito é de dar um enfoque que permita à reflexão dos interessados e os induza, caso assim queiram, a discordar, complementar ou simplesmente buscar um aprofundamento no estudo técnico na arte da escrita
Fonte: Obed de Faria Jr Site: obed.zip.net

quinta-feira, abril 21, 2011

Miguel Sanches Neto

Para minha surpresa e grande satisfação, o autor Miguel Sanches Neto (autor de Então você quer ser escritor?) está me seguindo no Twitter (o meu é @tarcmello) e postou minha resenha em seu blog Herdando uma Biblioteca.

Obrigado Miguel !

quinta-feira, abril 14, 2011

[Livro] Textos fundamentais, de Daniel Coleman (org.)

É possível que um livro que o leitor demorou mais de um ano para terminá-lo seja bom? Sim, é possível. Mas este, definitivamente, não é o caso de "Textos fundamentais".

Adquiri esse livro porque gosto de temas como gestão de pessoas, equipes, administração. Entendi bem a ideia proposta, disponibilizar resumos e análises curtas sobre os mais influentes livros de negócios de todos os tempos. Meu objetivo era conhecer, mesmo que superficialmente, a ideia de autores tão renomados para que, se me interessasse por algo, fizesse a leitura da obra em si.

É preciso fazer justiça que este não é um livro para ser lido em uma sentada, nem em duas, em três. Classifico-o como uma obra de referência, daquelas para se ter na mesa do escritório ou na estante e utilizá-la em pesquisas.

Mas a verdade tem que ser dita, o livro é ruim. A grande maioria dos livros analisados foi publicada há muitos anos atrás (muitos mesmo). Mas são estes os livros mais influentes, diriam os defensores. Concordo, mas poderia haver uma mescla maior com livros mais atuais. O mundo mudou, e não foi pouco. A tradução é simplesmente horrível! Algumas frases simplesmente não dizem nada. Outras ficam confusas, praticamente ilegíveis. Por fim, nas análises das obras a mesma coisa é dita várias vezes de forma igual ou muito semelhante. Enrolação pura.

"Textos fundamentais", na minha opinião, não serve nem para ocupar espaço na estante: é caríssimo e existem muitos outros livros tão ruins quanto ele, mas mais baratos e mais grossos.

quarta-feira, abril 13, 2011

O que leva você a comprar um livro?

O blog Livros e Afins está participando de um movimento chamado "blogagem coletiva". São várias perguntas referentes à leitura, sendo que a que mais me chamou a atenção até agora foi:

"O que leva você a comprar um livro?"

Minha resposta: Eu acredito que seja um conjunto de coisas que me faça tomar a decisão de comprar um livro. Leio bastante blogs literários e tenho a revista Veja como uma fonte de informações sobre bons livros. Considero principalmente o assunto mas me encanto com belas capas, com um material de qualidade. Para mim, não basta eu LER um bom livro, gosto de TER bons livros. Considero-me um egoísta literário, não troco meus livros. A minha estante, cada vez mais cheia, me encanta. Gosto de ver todos eles lá. Empresto somente aos amigos mais íntimos.

Responda você também !!!

segunda-feira, abril 11, 2011

[Livro] Então você quer ser escritor?, de Miguel Sanches Neto

Sou um apreciador de contos já há algum tempo. Talvez porque eu sonhe algum dia poder publicar os meus. Mas enquanto isso não acontece, os leio com dois objetivos: me divertir e aprender - plenamente atendidos nessa obra do paranaense Miguel Sanches Neto, bem conceituado no meio literário como crítico e autor.

Em uma resenha que fiz sobre um livro de contos de Tchecov, afirmei que os contos (em especial aqueles mais curtos) devem oferecer ao leitor um final que cause alguma surpresa, algo inesperado, que o faça pensar "eu realmente não tinha pensado nesse desfecho". Mas a literatura não define métodos, regras. É uma arte e, como tal, dá liberdade ao artista para fazer o que quiser. Se vai ficar bom, é outra história. Tchecov é um exemplo: seus contos tem finais melancólicos. São contos ruins? Claro que não, são ótimos. Mas continuo preferindo aqueles que me surpreendem. Sanches Neto consegue isso em vários dos contos deste livro, em especial nos excelentes "Sangue", "Animal nojento", "Redentor" e "Na minha idade", além do último, que dá nome ao livro, deliciosamente ousado e admirável.

Se existe um conselho que eu daria às pessoas que não curtem muito literatura mas que sentem-se culpadas por isso é começar lendo contos. São curtos, geralmente de leitura leve e agradável. Devem manter um bom livro de contos sempre à mão, para ler no banheiro, na cama antes de dormir, ou mesmo em uma viagem ou sala de espera de algum consultório médico. Mas tem que ser um livro bom, como este agradabilíssimo "Então você quer ser escritor?".

sexta-feira, abril 08, 2011

Como motivar um funcionário

Um dos assuntos que mais geram discussão, livros e artigos é a tentativa de responder a velha pergunta: como motivar os funcionários de uma empresa? Se existe tanta gente pensando sobre isso há anos é porque a resposta não é trivial.

Naturalmente, em se tratando de seres humanos, a forma de motivar um funcionário pode diferir totalmente daquela utilizada para fazer o mesmo com outro. O que é importante para um pode não ser para outro. Cada indivíduo tem sua vida particular, o modo como foi criado, sua formação acadêmica, suas características psíquicas, seus anseios e seus objetivos. Esse é o motivo pelo qual, vez por outra, ouvimos gestores dizendo que "mexer com gente não é facil".

Esse tema ressurgiu em meus pensamentos após ter lido um resumo do livro "The motivation to work", de Frederick Herzberg e outros. As ideias apresentadas pelos autores são fortemente fundamentadas na conhecidíssima hierarquia das necessidades de Maslow, mais conhecida como "pirâmide de Maslow" (quem fez MBA certamente já ouviu falar). Entretanto, pelo que pude perceber pelo resumo, não se trata de uma mera cópia. O que mais me agradou na obra de Herzberg, inclusive, foi a forma mais simples e objetiva que tratou o tema.

O pensamento principal do autor é o de que a motivação vem do interior da pessoa e não de uma política imposta pela empresa. Divide os fatores que influenciam a motivação em dois: higiêncios e motivacionais. Os primeiros abrangem necessidades básicas tais como condições de trabalho, benefícios e segurança. Os motivacionais englobam os fatores humanos: necessidade de realização, desenvolvimento pessoal, satisfação no trabalho e reconhecimento. O raciocínio mais interessante é o de que os fatores higiênicos, se atendidos, criam um ambiente propício para o funcionário buscar a motivação. Entretanto, a satisfação destes não necessariamente cria a verdade motivação. Ela só virá se houverem também os fatores motivacionais.

Herzberg fez uma distinção importante entre os fatores que causam infelicidade e aqueles que, efetivamente, contribuem para a satisfação no trabalho: "a inversão dos fatores que tornam as pessoas felizes não as torna infelizes". Em outras palavras, para tornar um funcionário satisfeito não basta eliminar a infelicidade dele. A ausência de infelicidade não necessariamente resulta em felicidade. Para termos uma motivação efetiva, a empresa tem que oferecer mais do que o básico fatores
higiênicos).

Tal discussão é bem pertinente nos tempos atuais em que, ainda, um grande número de empresas acredita que o funcionário deve sentir-se feliz simplesmente porque tem um bom salário pago em dia. Algumas nem isso fazem: nem um bom salário oferecem. E depois ainda reclamam do turnover alto e do baixo rendimento.

10 passos para ser escritor

Texto originalmente escrito por Charles Kiefer, em seu blog

1. Ninguém nasce escritor, torna-se escritor. E o que leva alguém a se transformar em escritor é a genética e a cultura. A primeira é destino, a segunda – é conquista. Para a primeira, ainda não temos solução. Para a segunda, basta a vontade, o desejo de ser. Como dizia Jean Paul Sartre, um ser humano será, acima de tudo, aquilo que tiver projetado ser.

2. Vontade sem ação é devaneio. Para de sonhar e age. Escrever é como nadar, como andar de bicicleta – é preciso movimentar os braços, movimentar as pernas. No caso da escrita, é preciso movimentar o cérebro.

3. O melhor exercício para o cérebro é a leitura. Além de nos transformar em escritores, a leitura é importante para a saúde, evita o Mal de Alzheimer.

4. Um escritor não precisa ser um lobo solitário, como pregava Hermann Hesse. Pode – e deve – freqüentar cursos acadêmicos, oficinas literárias. Aliás, hoje em dia, é aconselhável que pretendentes à escritura evitem o romantismo e as idéias feitas.

5. Desde o tempo de Platão e Aristóteles, só há dois tipos de escritores, os idealistas e os materialistas, e não há conciliação entre os dois. Há extraordinários escritores idealistas e péssimos escritores materialistas, e há extraordinários escritores materialistas e péssimos escritores idealistas.

6. Ser um escritor idealista ou materialista é só uma questão de ideologia, de visão de mundo. Evite, apenas, o panfletarismo, que é o uso servil das idéias. Não existe literatura isenta, politicamente. Na estrutura profunda de um texto, a ideologia sempre se manifesta. Na estrutura aparente, ou de superfície, o que importa é a técnica.

7. Só existem bons e maus escritores, no sentido técnico. O que são bons escritores – ainda não sabemos. O que são maus escritores nós o sabemos sobejamente.

8. São maus escritores aqueles que constroem histórias desconexas, de temas inexpressivos e estereotipados, em estilo adiposo, desajeitado, flácido, sem harmonia e sem sutileza, com cenas e situações inverossímeis, compostas com descrições desnecessárias e sem articulação com a narração, e arrematadas com diálogos artificiais e inúteis.

9. Todo escritor é um vir a ser. Acreditar-se pronto e acabado é o princípio da morte autoral. A obra prima pode ser a primeira, a décima segunda ou a última obra de um determinado autor. Quem assina a obra completa é a morte. Enquanto vivo, o escritor é um ser em construção. Por isso, o orgulho e a vaidade são extremamente perigosos. Quem sacraliza o próprio texto pode inventar uma nova religião, mas não uma grande literatura.

10. Um escritor somente é escritor quando menos é escritor, no instante mesmo em que tenta ser escritor e escreve. Na absoluta solidão de seu ofício, enquanto a mente elabora as frases e a mão corre para acompanhar-lhe o raciocínio, é escritor. Nesse espaço, entre o pensamento e a expressão, vibra no ar um ser sutil, fátuo e que, terminada a frase, concluído o texto, se evapora. Nesse átimo, o escritor é escritor. Aí e somente aí. Depois, já é o primeiro leitor, o primeiro crítico de si mesmo e não mais escritor.

Fonte: blog Livros só mudam pessoas

sexta-feira, março 04, 2011

[Livro] Madame Bovary, de Gustave Flaubert

Uma mulher sonhadora casa-se com um homem honesto e trabalhador mas que não consegue satisfazer os seus desejos. Ela então entrega-se aos prazeres e perigos do adultério sem que ele, envolto em sua imensa bondade e paixão pela mulher, sequer desconfie.

Esse enredo bem que poderia ser mais uma história da novela das oito mas é a trama principal desse romance muito famoso escrito pelo francês Gustave Flaubert, que teve problemas na época em função do assunto "ousado" e "vulgar" existente em seu livro.

Acredito que quase tudo que poderia ser falado sobre "Madame Bovary" já o foi, visto que a história atravessou séculos, sempre sendo sucesso de público e de crítica. A qualidade literária é inegável. Sem utilizar-se das técnicas atuais (de qualidade duvidosa) para prender o leitor, o autor dá à história um ritmo tranquilo Os personagens principais têm suas personalidades moldadas aos poucos, sem o excessivo uso de adjetivos que infelizmente tem se tornado comum aos autores mais novos.

Trata-se, sem dúvida, de um romance atemporal: as angústias, alegrias, tristezas, preoucações e desejos de Emma Bovary não diferem muito das mulheres atuais, principalmente aquelas que veem suas indivualidades anuladas por um casamento com a pessoa errada.

"Madame Bovary" é um clássico. Um leitor que se preze deveria, mais cedo ou mais tarde, apreciá-lo. Mesmo porque além de se deliciar com a técnica apurada do escritor e com o enredo agradável, irá se divertir ao ver em Emma atitudes semelhantes às de alguma vizinha, amiga ou ... amante.

segunda-feira, janeiro 31, 2011

[Livro] Contos Húngaros, de Kosztolányi, Csáth, Karinthy e Krúdy

O que levaria um leitor a dedicar parte de seu precioso tempo à contos húngaros? Por que não contos de países mais "tradicionais", contos alemães, franceses, britânicos, americanos ou mesmo lusitanos? E, obviamente, por que não contos brasileiros? Mas não, essa resenha refere-se mesmo aos contos húngaros.

Conheci o livro através de uma indicação bem positiva da seção "Veja Recomenda", da revista Veja. Como se somente isso não bastasse, reparei pela foto da capa que tratava-se de uma publicação da editora Hedra. Meu primeiro contato com a Hedra foi através da obra "Feitiço de Amor e Outros Contos" (http://www.skoob.com.br/livro/55035-feitico-de-amor-e-outros-contos). Em formato "pocket book", a editora tem feito um trabalho de qualidade superior, tanto no que se refere ao material e acabamento mas ainda mais quando falamos das informações contidas nas introduções, além das traduções irretocáveis.

Contos Húngaros traz uma introdução riquíssima de Nelson Ascher. Ele, com muita propriedade, inicia afirmando que o tamanho ou riqueza de uma nação não necessariamente tem relação com a qualidade de sua literatura. Apresenta ao leitor, de forma breve mas não superficial, um pouco da história e da cultura desse país situado na Europa Central. Na sequência discorre sobre os autores que fazem parte da coletânea: Kosztolányi, Csáth, Karinthy e Krúdy.

O estilo literário dos escritores varia, indo do humor ao realismo mágico. São textos bem escritos, que prendem o leitor. A qualidade é exacerbada pelo brilhante trabalho de tradução. A verdade é que os até então desconhecidos "contos húngaros" podem nos divertir e nos enriquecer culturalmente. E viva Budapeste!

sexta-feira, janeiro 21, 2011

[Livros] Os segredos da ficção, de Raimundo Carrero


Tomei conhecimento deste livro através de um blog literário que acesso periodicamente. Eu, além de ser um apaixonado pela leitura, sonho em algum dia publicar algo, além dos textos amadores que já postei em meu blog (http://pessoailtda.blogspot.com). Nas informações que obtive a respeito da obra, gostei do fato do autor não ter como objetivo ditar regras sobre como escrever bem. Isso é realmente impossível, considerando-se que a literatura é uma arte e como tal tem suas infinitas nuances, características e qualidades.

Seria possível alguém transformar-se em um escritor de qualidade lendo um livro como este? Acredito que não seria suficiente. Eu, particularmente, creio que um bom escritor já nasce com um dom. Obviamente que esse dom pode ou não ser estimulado e desenvolvido durante a infância, a adolescência e mesmo na idade adulta. Por outro lado, nenhum escritor é bom ou perfeito o bastante para não poder melhorar sua técnica.

A maior qualidade de "Os segredos da ficção" é não pretender ser um manual. Não há como definir padrões para um bom romance, um bom conto. O autor dá dicas, ensina técnicas e fornece um bom conhecimento teórico através de exemplos. E o resultado é realmente muito interessante.

Apesar de usar uma linguagem bastante acessível, em alguns pontos o que podemos chamar de teoria literária se mostra um tanto prolixa aos escritores amadores. Não vejo isso como uma falha. É até uma forma dos amadores sentirem-se motivados e curiosos a ponto de evoluírem seus estudos de técnicas literárias.

"Os segredos da ficção" não é um livro para ser lido uma única vez. Não há como decorar seus ensinamentos. Eles têm que ser absorvidos naturalmente. Diante disso, acredito que seja possível obter o máximo potencial de seu conteúdo através de duas, três ou até mais leituras, intercaladas com exercícios de escrita e consumo de outros livros.

quarta-feira, janeiro 19, 2011

[Livro] Uma Breve História do Século XX, de Geoffrey Blainey

Talvez nunca tenha havido um outro momento em que os livros de História vendessem tanto quanto agora. Isso é fruto, sem dúvida alguma, da abordagem diferente que alguns autores passaram a dar ao assunto. Nada daquela decoreba chata de datas e nomes. Tornou-se possível ler sobre História como se estivéssemos lendo um romance.

"Uma Breve História do Século XX" segue esta linha. Os principais acontecimentos e personagens do século passado são abordados de maneira leve e interessante, dando um panorama muito rico sobre como os fatos aconteceram e de que forma eles ainda influenciam o mundo atual.

Apesar dessa leveza toda, creio que seja um livro para quem gosta de História. O fato de tratar os assuntos de forma resumida, exige do leitor um certo conhecimento prévio dos acontecimentos históricos, sob pena de parecerem fatos isolados e sem a devida importância.

A leitura é fácil e bastante rápida. Tenho convicção de que se as escolas passassem a adotar material didático nessa linha, teríamos muito mais crianças interessadas pela História, o que os tornariam adultos mais conscientes e engajados.

quinta-feira, dezembro 30, 2010

Livros lidos [2009 - 2010]

No final de 2009 eu gostaria de ter postado aqui os livros que li no ano mas acabei me esquecendo. Dessa forma, postarei abaixo junto com os lidos em 2010.

[2009]

1) O Caçador de Pipas, Khaled Hosseini
2) A Cidade do Sol, Khaled Hosseini
3) Think!, MICHAEL R LEGAULT
4) Clássicos do Mundo Corporativo, Max Gehringer
5) Para Ler como um Escritor, Francine Prose
6) Frenesi Polissilábico, Nick Hornby
7) Execução, Larry Bossidy, Ram Charan
8) Os 100 Melhores Contos Brasileiros, Vários
9) Um Conto de Natal, Charles Dickens
10) O Mercador de Veneza, William Shakespeare
11) A Dama do Cachorrinho, Anton Tchekhov
12) Espiões, Michael Frayn
13) A Sombra que me Seguia, Adriane Salomão
14) O Líder criador de Líderes, Ram Charan
15) Cenas da Vida na Aldeia, Amos Oz
16) Leite Derramado, Chico Buarque
17) O Andar do Bêbado, Leonard Mlodinow

[2010]

1) O Símbolo Perdido, Dan Brown
2) Se eu fechar os olhos agora, Edney Silvestre
3) Jornal Nacional - Modo de Fazer, William Bonner
4) Feitiço de Amor e outros contos, Ludwig Tieck
5) Crime e Castigo, Fiódor Dostoiévski
6) Uma breve história do mundo, Geoffrey Blainey
7) Metamorfose, Franz Kafka
8) O Vale dos Anjos - O Torneio dos Céus, Leandro Schulai
9) O Assassinato e outras histórias, Anton Tchekhov
10) Mundo de Avalon, Vincent Law

Link para minha "estante" no Skoob.

segunda-feira, dezembro 27, 2010

[Livro] Mundo de Avalon, de Vincent Law


Fazer uma resenha de um livro não é tarefa das mais fáceis. Quando o autor é alguém que você respeita bastante, fica ainda mais difícil. Eis minha missão ...

Num gesto de gentileza ímpar, Vincent entrou em contato comigo oferecendo uma cópia autograda de sua obra, sem custo algum. Logicamente que aceitei, sentindo-me honrado e logo que pude iniciei a leitura.

Nunca escondi que Literatura Fantástica não é um dos meus gêneros preferidos. Mas como bom leitor que se preze (ou que queira se tornar um bom leitor) me permiti conhecer um pouco mais sobre o assunto. Mas no caso de "Mundo de Avalon", essa falta de sintonia revelou-se impactante.

Vincent, demonstrando uma criatividade incrível, criou o seu mundo, povoando-o com personagens, poderes, impérios, seres sobre-humanos. Além disso, utilizou alguns nomes bastante complexos e acredito inéditos para identificá-los. Isso torna a leitura bastante difícil e confusa em algumas partes, em especial em seus primeiros capítulos.

O autor usa e abusa de diálogos. O uso excessivo dessa técnica deixa o texto pobre e sem ritmo. Em especial, em "Mundo de Avalon", os diálogos muitas vezes se mostram realmente carentes de uma riqueza literária maior. O uso constante dos "Hum?" e "Hã?" exemplifica bem.

Outro ponto a ser destacado é a importância dada à descrição minuciosa dos personagens e ambientes. O uso excessivo de adjetivos torna o texto rebuscado sem necessidade e deixa o leitor com aquela velha sensação de "enchimento de linguiça".

Definitivamente "Mundo de Avalon" não é um "vira páginas". Seu enredo não empolga. A utilização de capítulos curtos, que geralmente prende o leitor, não funciona neste caso, talvez pela quantidade de frases, pensamentos e filosofias colocadas entre eles.

O objetivo do autor ao escrever a obra (que na verdade é a primeira de uma série) talvez tenha sido o de inovar na linguagem e na estrutura de seu texto. Pode ser que esteja um pouco a frente do seu tempo (ou do meu tempo como leitor). Apesar de não ter agradado tanto, confesso uma certa curiosidade em ver como Vincent dará prosseguimento à sua história.

sexta-feira, novembro 19, 2010

Moleskine

Hoje em dia, com o advento das novas tecnologias, as pessoas pouco escrevem manualmente. Usam o celular, o notebook, o netbook, o iPad ... Eu entretanto, apesar de trabalhar com tecnologia, ainda sou meio nostálgico em relação a isso; gosto de escrever em papel minhas anotações, lembretes, tarefas e ideias. Só que diante de concorrentes tão modernos, o ato de escrever manualmente em papel precisa de um charme, de um atrativo, de algo que dê prazer. É para isso que existem os Moleskines e similares.

Moleskine é uma espécie de caderno de anotações com capa dura, elástico para fechar e uma fita de cetim usada como marcador de páginas. A história do Moleskine original remonta o século XIX, quando era fabricado de forma artesanal principalmente na Itália. Em 1996 a marca Moleskine foi finalmente registrada e em 2006 o fundo de investimentos francês Société Générale a adquiriu.

Atualmente existem diversos modelos de Moleskine: grandes, pequenos, cores variadas, estampados, com pauta, sem paula, abertura lateral, abertura na parte inferior, guias turísticos, etc. Sugiro que visitem o site da Moleskine (em inglês), realmente vale a pena.

Até bem pouco tempo atrás para nós brasileiros adquirirmos um Moleskine original precisávamos comprar no exterior ou importar. Hoje em dia já é possível encontrá-los na FNAC e na Livraria Cultura. Os preços não são muito convidativos, mas a qualidade e o charme realmente valem a pena. Uma outra opção é comprar diretamente dos EUA através do site da Amazon (o frete não é barato e o tempo de entrega é grande, mas mesmo assim vale a pena financeiramente).

Existem também réplicas do famoso bloco de anotações fabricadas por empresas brasileiras como a Cícero Papelaria, Atelier Machado e Papeterie Chic.

O último modelo de Moleskine que me chamou a atenção faz parte de uma coleção chamada Passions, em especial a versão Book Journal , indicada para os amantes da leitura e da Literatura, onde podemos fazer anotações e comentários sobre os livros que lemos, tornando o hábito da leitura ainda mais agradável e enriquecedor.

segunda-feira, novembro 08, 2010

[Conto] A mulher perfeita

          Ele estava no auge da carreira, trinta e cinco anos, bom salário, morando sozinho, sem dever satisfação a ninguém. Solteiro sim, sozinho nunca. A combinação formada pela boa aparência, roupas caras e carro do ano atraía belas mulheres. Preferia não manter nenhum relacionamento sério ou duradouro. Ouvia constantemente as reclamações dos amigos casados ou em relacionamento estáveis: a mulher não deixa fazer isso, não deixa aquilo, reclama de tudo, só pensar em gastar dinheiro. Ele ria daquilo tudo, afinal não fazia parte do seu cotidiano.

          Tudo mudou quando a conheceu em um site da internet. Pele morena, cabelos negros, olhos verdes. Apesar de viver uma felicidade plena, entendeu que a companhia dela em casa lhe faria bem. Sempre de cara boa, sempre em casa esperando-o voltar do trabalho, qualquer que fosse o horário. Não fazia escândalo quando ele resolvia sair sozinho com os amigos e amigas. Não exigia nenhum tipo de fidelidade. E quando ele não encontrava nada interessante nas baladas, lá estava ela pronta para satisfazer seus instintos mais primitivos. Ela era totalmente diferente das esposas e namoradas dos seus amigos. Quem disse que não existe mulher perfeita? Ele havia encontrado uma.

          Mas o tempo cuidou de minar o relacionamento entre os dois. Ele já não dava mais atenção a ela. Dormia fora de casa, deixando-a sozinha no apartamento. Chegava em casa e passava direto por onde ela estava, sem trocar uma única palavra. E ela lá, passiva, sem reclamar de nada, com a mesma carinha de sempre.

          Até que um dia ela não aguentou mais e estourou ...

          A única reação que ele teve foi a de entrar novamente naquele site de produtos eróticos e comprar uma nova boneca inflável. Só que desta vez loira de olhos azuis, já tinha enjoado da morena de cabelos negros.

quarta-feira, setembro 22, 2010

[Conto] A falta que um beijo faz

     Após ser carregada, a carreta de mais de vinte metros iniciou sua vagarosa viagem em direção ao seu destino: uma grande obra no interior do estado. Levava consigo enormes tubos de aço que seriam utilizados em um gasoduto.

     Ele estava casado há oito anos, tinha uma filha de cinco. O emprego, apesar de lhe render um salário razoável, não o motivava mais. O relacionamento com a esposa já dava sinais de esfriamento. Mesmo assim tocava a vida em frente, conformado com a situação, sentindo-se até um pouco culpado com aquilo tudo. Filho de pai funcionário público e mãe dona de casa, nasceu há trinta e dois anos naquela mesma cidade. Teve uma infância tranquila, o que combinava muito com seu jeito de ser. Desde jovem caracterizava-se por ser uma pessoa amável e do bem, evitando confusões a qualquer custo. Filho obediente e aluno mediano, nunca gerou maiores transtornos aos pais, ao contrário de seu irmão mais novo, que tinha o gênio totalmente diferente, vivendo a vida intensamente sem se preoucupar com as consequências.

     Chegou em casa por volta das dezenove horas. Aliás, esse era um dos motivos das discussões constantes com a mulher. Dedicava-se muito ao trabalho e pouco à família, dizia ela. Estava cansado e foi logo para o banho, após trocar no máximo umas cinco palavras com a filha. Para a mulher, somente um olhar e um cumprimento com a cabeça. Ainda gostava dela, sentia um carinho imenso. Mas aquela não era a vida que tinha planejado para si mesmo. Sonhara com uma vida mais requintada. Não queria chegar em casa e encontrar sua mulher vestida com uma bermuda surrada e chinelo de dedo. Sabia que ela não era a única culpada por aquela situação. Aliás, ela nem era a mais culpada. Sentia-se mal em tratá-la assim, mas de alguma maneira enxergava nisso a própria infelicidade.

     A esposa aguardava pacientemente no sofá o marido terminar o banho para lhe contar a boa nova: havia conseguido um emprego. Tudo bem que não era um emprego daqueles: assistente de manicure, meio período. Mas era um recomeço depois de ter parado de trabalhar logo que a filha nasceu. O chuveiro foi desligado, deu um tempo. Já tinha até ensaiado a maneira como falaria, destacando as vantagens de um dinheiro a mais em casa e principalmente a oportunidade dela sair de casa, ocupar a cabeça, conhecer gente nova. E nada dele aparecer. A novela terminou. Foi até o quarto e o encontrou deitado na cama, dormindo e roncando.

     Acordou bem cedo no dia seguinte, como de costume. Preparou o café e aguardou pacientemente o marido na cozinha, a fim de finalmente conversarem sobre o novo emprego. Ele entrou na cozinha, de forma atabalhoada, dizendo que estava atrasado, que naquele dia precisava chegar mais cedo. Ela então percebeu que não seria o momento adequado. Ficou quieta no seu canto, comeu um pedaço de bolo e foi até o quarto arrumar a cama. No corredor, encontrou com a filha que acabara de se levantar. Depois de alguns minutos ouviu o marido gritar da sala que já estava indo trabalhar. Ela gritou de volta, pedindo ao marido que esperasse um pouquinho, queria dar-lhe um beijo antes de sair. Guardou os travesseiros no guarda-roupa e foi até a sala. O marido já tinha saído, não esperou pelo beijo.

     O trânsito estava infernal. Ele resolveu fazer um caminho alternativo, passando pela rodovia. Ao entrar na pista dupla, visualizou à sua frente uma grande carreta transportando tubos de aço. Não deu tempo de desviar quando um dos tubos se soltou e caiu bem na sua frente. O impacto foi violento e fatal. Não deu tempo de entender que aquele beijo poderia ter salvado sua vida.

segunda-feira, setembro 13, 2010

[Livro] O Vale dos Anjos - O Torneio dos Céus, de Leandro Schulai


Resenhar "O Vale dos Anjos - O Torneio dos Céus" com certeza não é uma tarefa simples para mim. Através dos benefícios das comunicações virtuais, acabei tornando-me amigo do autor Leandro Schulai, que inclusive teve a gentileza de me enviar um exemplar autografado. Com a certeza de que Schulai não esperaria uma postura diferente, tentarei ser o mais honesto e imparcial possível.

De início é importante destacar que o gênero de literatura fantástica nunca me atraiu muito. Decidi ler "O Vale dos Anjos" devido à curiosidade sobre uma obra que praticamene vi nascer e também ao respeito que tenho pelo trabalho de novos escritores, em especial o amigo Leandro. Para minha surpresa e satisfação, depois de algumas páginas senti-me envolvido por uma história extremamente criativa. Tive sensação semelhante, guardadas às devidas proporções, na leitura de "Crime e Castigo". Não obviamente pela história ou estilo literário e sim sobre o espanto em ver como uma pessoa é capaz de imaginar tanta coisa e conseguir narrá-las sem perder a coerência e consistência.

A história trata da vida pós-morte do jovem grego Dimítris, que deixou a sua amada Mariah após um trágico acidente automobilístico. Schulai descreve uma ideia de Paraíso no mínimo interessante e curiosa, culminando com o torneio que dá nome ao livro.

Apesar de enxergar várias qualidades na narrativa do autor, acredito que alguns pontos possam ser melhorados. Em certas partes do texto, pode-se notar frases que poderiam ser omitidas sem prejuízo do entendimento e que parecem estar presentes desnecessariamente. Da mesma forma, algumas frases parecem simplistas demais, destoando um pouco do que se espera de uma obra literária. Por fim, sinceramente não fiquei satisfeito com o final. Esperava algo mais esclarecedor ou empolgante depois de ter lido mais de quatrocentas páginas, que acabaram se mostrando mais interessantes no desenvolvimento da história do que em seu "grand finale".

De qualquer forma fica claro o talento e o futuro promissor do escritor Schulai. Ainda mais por ter escolhido um gênero que tem encontrado público fiel e crescente, principalmente entre os mais jovens. Não tenho dúvidas que os próximos livros, que dão sequência à saga do grego Dimítris, terão sucesso.

segunda-feira, setembro 06, 2010

[Conto] Seis horas da manhã

          Nem todo casamento arranjado está fadado ao insucesso. Ela, na flor de seus dezoito anos, foi praticamente obrigada a se casar com o filho daquele capataz que trabalhava com seu pai, naquela imensa fazenda de café. Já o conhecia desde criança, cresceram juntos. Definitivamente ele não despertava nela nada mais do que umas simples amizade. Mas não havia outra opção. Saía da fazenda somente aos domingos para ir à missa com a família. Não conhecia mais ninguém. Seu pai e sua mãe ficaram radiantes quando ela aceitou o pedido de casamento.

          Perdeu a virgindade na noite de núpcias. Ele se mostrou todo carinhoso e respeitador. Para ele não era a primeira vez. Ela gostou, apesar de ter ficado um pouco assustada. Com o passar do tempo ele foi conquistando sua admiração pelo modo delicado e atencioso. Era uma mulher feliz, ainda mais porque seu marido gostava de tê-la toda noite. Ela havia descoberto o prazer da vida a dois, adorava! Apesar de gostoso, a relação íntima era metódica ao ponto de ser executada sempre no mesmo horário, às seis horas da manhã. Ele acordava pouco antes, tirava a roupa dela, deitava por cima e pronto. Dia após dia, a rotina se repetia, o galo cantava, o sol começando a dar o ar da graça e os dois lá, sempre ele por cima, ela por baixo, ela nua, ele com a roupa de bairro arriada, às seis horas da manhã.

          Sua pouca experiência com outros homens a deixava intrigada. Gostava do jeito que o marido fazia, mas será que era só aquilo mesmo? Sempre que ela ameaçava pedir algo diferente, ele desconversava. Sentia-se um pouco culpada, afinal era bem tratada, seu marido sempre a procurava. Resignada, buscava meios de parar de pensar nisso e seguir a vida adiante.

          Um dia seu marido saiu em viagem para buscar uma boiada em outro estado. Ela ficou sozinha, mas não havia perigo, sua casa ficava há apenas alguns poucos quilômetros de seus pais, na mesma fazenda. Ocupava-se com os afazeres domésticos, sempre vestida com aquele vestidinho florido, curto e solto, que mostrava bem suas belas curvas. O cabelo preto e liso, escorria até quase a cintura. Tinha os seios pequenos, mas empinados. O traseiro por sua vez era carnudo e largo.

          Estava escurecendo, escutou palmas na frente de casa. Foi ver quem era e se surpreendeu ao ver seu primo. Ele era poucos anos mais velho que ela, havia morado na fazenda até uns dez anos de idade, depois se mudou junto com a família para o norte. Não tinha como não reconhecer aquele rosto que ainda parecia de menino. Mas o corpo já era de homem. Estava de passagem pela região e resolveu visitar os tios, que deram a notícia de que a bela prima morena havia se casado. Ao saber que o marido não estava em casa, preferiu não entrar, mas a prima insistiu tanto que foi até a cozinha tomar um café e comer um pedaço de bolo de fubá. Apesar do respeito, o primo encantou-se com aquele belo corpo. Quando ela se levantou para lavar a xícara, reparou nas coxas grossas. Excitou-se, procurou esconder, mas ela ao virar percebeu. O sangue dos dois ferveu, não falaram mais nada, ela já se aproximou. Beijaram-se, ele a abraçou, puxou as alças do vestido, que caiu no chão. Ela tremia, finalmente teria uma emoção diferente, proibida. Fez tudo que tinha vontade e coisas que nem imaginava o quanto era bom. Sentia-se leve, realizada.

          Nessa hora ela acordou assustada. O relógio marcava seis horas. Estava sozinha na cama, com o corpo quente e suado e a respiração ofegante.

sexta-feira, setembro 03, 2010

[Conto] O barulho da porta

          Aeroporto lotado. Aquelas viagens vinham lhe cansando mais do que o de costume. Sorte que sua competência havia permitido que o trabalho fosse finalizado em menos tempo, proporcionando a situação inédita de voltar para casa na sexta pela manhã. Preferiu não avisar sua esposa, com o objetivo de fazer uma surpresa. Após seis meses de casamento continuavam totalmente apaixonados um pelo outro. Os dias fora de casa fizeram aumentar ainda mais a vontade de estar com ela.

          O táxi deixou-lhe na porta do prédio. Subiu, abriu a porta lentamente. Não havia ninguém em casa. Foi até o quarto, colocou a mala em cima da cama e começou a ajeitar tudo. Nesse momento ouviu o barulho da porta. Moveu-se lentamente até o corredor. Viu primeiro a imagem de um homem desconhecido. Ele já estava sem camisa, mostrando suas costas largas e a pele bronzeada. Ficou paralisado. Foi quando viu aquele mesmo homem levantando o vestidinho branco dela, deixando metade daquele belo corpo nu à mostra. Começaram então a se beijar loucamente, a se encostarem, a se pegarem de forma intensa.

          Aquilo estava deixando-o confuso. O correto seria acabar com aquela palhaçada logo, onde já se viu!? Dentro da sua própria casa. Quem ela achava que era? Percebeu, entretanto, que estava excitado com a situação. Continuou no corredor, meio escondido, sem tirar o olho dos dois. Queria ver até onde teriam coragem de chegar. Ainda observando à espreita, viu os dois finalmente consumarem o ato final. Com medo de ser visto, retornou ao quarto. Resolveu voltar. Atravessou o corredor rapidamente. Ouviu novamente o barulho da porta. Escondeu-se. Era sua mulher chegando da academia. Ainda bem que a empregada e seu namoradinho já haviam terminado tudo e não estavam mais na sala.

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