segunda-feira, março 19, 2012

[Conto] Nos corredores do hospital

Rafaela finalmente havia conseguido aquele tão sonhado estágio em um dos melhores hospitais do país. Depois de tanto ralar na faculdade foi selecionada, depois de dois anos batalhando por aquela vaga. Apesar de um currículo invejável para qualquer enfermeira da sua idade, percebeu que desta vez sua beleza havia ajudado. E muito.

O diretor da área em que estava atuando era um médico de meia idade, não muito além dos quarenta. Desde aquele momento em que entrou em sua sala para a entrevista percebeu que ele tinha um jeito diferente. Extremamente educado, seu olhar era penetrante. Desconcertante. Apesar de um tom muito profissional, percebeu que aquele homem era daqueles dos quais gostava muito; safados na medida certa. Bem ao contrário do seu namorado.

O namoro já se arrastava há seis anos, desde o início da faculdade. No começo até que era legal, os dois com aquele ímpeto natural dos jovens, principalmente em início de namoro. Ele tinha uma pegada ... Uau. Tinha. Há algum tempo o relacionamento resumia-se a jantares, filminhos com pipoca. O sexo existia, mas mecânico e com ar de obrigatoriedade. Nem quando ele começou a trabalhar na melhor academia da cidade, atuando com personal trainer de mulheres maravilhosas a coisa mudou. Rafaela chegou até sentir um pouco de ciúme, depois imaginou que conviver com mulheres daquele nível poderia deixá-lo mais interessado. Nem isso.

Ela recebia inúmeras cantadas, todos os dias. Todas as noites. Mesmo porque ela não se preocupada em disfarçar seu belo corpo, malhado e empinado, sempre por baixo das famosas roupas de enfermeira, fruto dos mais inenarráveis fetiches masculinos. Ela gostava disso, de ser observada, desejada. Cada vez que cruzava com o tal diretor nos corredores do hospital, sentia aquele olhar passear desde a base do seu salto alto até o último fio de cabelo. Como tinha a curiosidade de virar para trás, para ter certeza de que ele torcia o pescoço para observar sua bunda. Ela, que de santa não tinha nada, provocava com olhares, sorrisos e com alguns centímetros a menos de saia.

Tortura era sair daquele ambiente com o sangue fervilhando de tesão e depois ter que assistir a nova das nove na casa da sogra, sentada naquele sofá desconfortável. Para dar vazão a toda aquela vontade, começou a sugerir coisas novas para o namorado. Mas ele se mostrava sempre cansado, indisposto. Há algum tempo começou a se mostrar ainda mais calado.

Bem  na época em que decidiu investir mais seriamente na loucura de seduzir seu diretor, começou a senti-lo diferente e distante. Já não a olhava com o mesmo desejo. Estava muito sério, raramente sorria. Não esperava mais ela passar no corredor para ir atrás, se deliciando com seu andar. Naquele dia, sentada na cantina do hospital junto com uma colega de trabalho, o viu passar de cabeça baixa. "O que aconteceu com o diretor? Ele está tão diferente". A amiga respondeu: "Não está sabendo do babado? A mulher dele o largou. Está saindo com o personal trainer dela e ainda saiu falando que ele não dá conta do recado". Intrigada, Rafaela fez uma última pergunta: "Personal trainer ? Qual é a academia da mulher dele?". Já se levantando, ouviu a resposta: "É a mesma que seu namorado trabalha".

Um comentário:

Marina Carla disse...

Lembrou-me um capítulo de novela.. ou, remotamente, um dos escritos sacanas do Stanislaw Ponte Preta.
Gostei do modo como conduziste o conto.

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